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A sala fez-se silenciosa; as conversas bulhentos cessaram... |
Não percebeu que a sua afirmação havia escandalizado as senhoras e continuou serenamente: — Lá não há esse nosso desregramento, essa falta de respeito, essa impudicícia de costumes... Há moral... O senhor quer ver uma cousa: outro dia fui ao teatro. Quer saber o que me aconteceu? Não pude ficar lá... Era tal a imoralidade que... — Que peça era, doutor?—indagou Mme. Barbosa. — Não sei bem... Era Iaiá me deixe. — Ainda não vi, disse candidamente Irene. — Pois não vá, menina! fez com indignação o doutor Florentino. Não se esqueça do que Marcos diz: "Qualquer que fizer a vontade de Deus, esse é meu irmão, e minha irmã, e minha mãe, isto é, de Jesus." Florentino gostava dos Evangelhos e os citava a cada passo, com ou sem propósito. Alguns hóspedes levantaram-se, muitos já se tinham retirado. A sala esvaziava-se e não tardou que o jovem Benevente se erguesse também e saísse. Antes passeou pela sala o seu olhar de pequeno símio, cheio de pequeninas espertezas, rematou sentenciosamente: — Todos os povos fortes, como os homens, são morais, isto é, são castos, doutor Florentino. Concordo com o senhor. Conforme tinham prometido, no dia seguinte, vieram as malas dos ingleses; mas não apareceram nesse dia na sala de jantar, nem em outras partes da pensão se mostraram aos hóspedes. Só no outro dia imediato, pela manhã, à hora do almoço, foram vistos. Entraram sem descansar o olhar sobre ninguém; cumprimentaram entre os dentes e foram sentar-se no lugar que Mme. Barbosa lhes indicou. Como parecessem não gostar dos pratos que lhes foram apresentados, Dona Sinhá apressou-se em ir receber as suas ordens e logo se pôs a par de suas exigências e correu à cozinha para as providências necessárias. Miss Edith, como se sonhe mais tarde chamar-se a moça inglesa, e o tio comiam calados, lendo cada um para o seu lado, desinteressados de toda a sala. Vendo Dona Sofia os rapapés que a dona da pensão fazia ao par albiônico, não pôde deixar de dar um muxoxo, que era o seu modo costumeiro de criticar e desprezar. Todos, porém, olhavam de soslaio para os dois, sem animo de dirigir-lhes a palavra ou fixá-los mais demoradamente. Assim foi o primeiro e nos dias que se seguiram. A sala fez-se silenciosa; as conversas bulhentos cessaram; e, se alguém queria pedir qualquer cousa ao copeiro, falava baixo. Era como se de todos se tivesse apossado a emoção que a presença dos ingleses trouxera ao débil e infantil espírito da preta Angélica. |
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