AO ATOR JOAQUIM AUGUSTO



Um dia Pigmalião — o estatuário
Da oficina no tosco santuário
Pôs-se a pedra a talhar...
Surgem contornos lânguidos, amenos...
E dos flocos de mármore outra Vênus
Surge dest’outro mar.

De orgulho o mestre ri... A estátua é bela!
Da Grécia as filhas por inveja dela
Vão nas grutas gemer...
Mas o artista soluça: "Ó Grande Jove!
"Ela é bela... bem sei — mas não se move!
"É sombra — e não mulher!"

Então do excelso Olimpo o deus-tonante
Manda que desça um raio fulgurante
À tenda do escultor.
Vive a estátua! Nos olhos — treme o pejo,
Vive a estátua!... Na boca — treme um beijo,
Nos seios — treme amor.

O poeta é — o moderno estatuário
Que na vigília cria solitário
Visões de seio nu!
O mármore da Grécia — é o novo drama!
Mas o raio vital quem lá derrama?...
É Júpiter!... És tu!...

Como Gluck nas selvas aprendia
Ao som do violoncelo a melodia
Da santa inspiração,
Assim bebes atento a voz obscura
Do vento das paixões na selva escura
Chamada — multidão.

Gargalhadas, suspiros, beijos, gritos,
Cantos de amor, blasfêmias de precitos,
Choro ou reza infantil,
Tudo colhes... e voltas co’as mãos cheias,
— O crânio largo a transbordar de idéias
E de criações mil.

Então começa a luta, a luta enorme.
Desta matéria tosca, áspera, informe,
Que na praça apanhou,
Teu gênio vai forjar novo tesouro...
O cobre escuro vai mudar-se em ouro,
Como Fausto o sonhou!

Glória ao mestre! Passando por seus dedos
Dói mais a dor... os risos são mais ledos...
O amor é mais do céu...
Rebenta o ouro desta fronte acesa!
O artista corrigiu a natureza!
O alquimista venceu!

Então surges, Ator! e do proscênio
Atiras as moedas do teu gênio
Às pasmas multidões.
Pródigo enorme! a tua enorme esmola
Cunhada pela efígie tua rola
Nos nossos corações.

Por isso agora, no teu almo dia,
Vieram dando as mãos à Poesia
E o povo, bem o vês;
Como nos tempos dessa Roma antiga
Aos pés desse outro Augusto a plebe amiga
Atirava lauréis...

Augusto! E o nome teu não se desmente...
O diadema real na vasta frente
Cinges... eu bem o sei!
Mandas no povo deste novo Lácio...
E os poetas repetem como Horácio:
"Salve! Augusto! Rei!"
São Paulo, outubro de 1868