Teófilo gastou uma noite inteira em construir as expressões com que devia dar parte à mãe ...



Teófilo gastou uma noite inteira em construir as expressões com que devia dar parte à mãe de que ia à partida do comendador N... Parecia-lhe crime ir divertir-se e deixar em casa aquelas duas pessoas que estremecia.

D. Tereza, quando soube da resolução arrancada a seu filho pelas instâncias dos amigos, respondeu-lhe com palavras de verdadeira alegria.

- Ainda bem, dizia ela, que vais sair da vida monótona em que andas. Que mocidade a tua! Nem uma distração, nada! É preciso não estragar os melhores anos, Teófilo!

Quanto a Helena, se Teófilo reparasse melhor, viria que atrás do sorriso de prazer que a moça procurava desfolhar dos lábios vermelhos, havia outro sorriso de mágoa e de pesar. Seria mágoa e pesar de moça por não ir tomar parte igualmente no sarau?

Chegou o sábado aprazado.

Teófilo tinha pouco que fazer nesse dia. Voltou para casa cedo, afim de aproveitar, na companhia da família, as horas que ia perder no baile do comendador.

À hora marcada vestiu-se e saiu.

Em casa do comendador estavam reunidas algumas entidades políticas, outras literárias, outras elegantes; outras sem definição. Estes eram em maior número. Augusto, o amigo que convidara Teófilo, apresentou-o à família do comendador e a algumas das pessoas mais notáveis da reunião.

Teófilo tinha um ar modesto e discreto que não podia ajuda-lo nas relações com os outros. O grande talento da conversação é saber calar-se, diz A. Karr; Teófilo tinha esse talento, mas em excesso; não podia fazer fortuna.

Era a primeira vez que o poeta se achava em uma reunião de certa ordem. Tudo ali contribuía para fascina-lo. O esplendor das mulheres, a abundância das luzes e das flores, as condecorações, os nomes ilustres que se pronunciava de cada lado, o bulício, o perfume, tudo se acumulava para dar ao rapaz a idéia de um mundo novo e imaginário.

Augusto, como bom amigo, serviu a Teófilo de cicerone. Apresentou-o a algumas mulheres em quem fizera impressão o ar tímido e recatado do poeta. Augusto obrigou-o mesmo a dançar uma quadrilha.

No fim de uma hora, Augusto, Teófilo e alguns outros amigos estavam em uma sala contígua ao salão do baile, mas perfeitamente deserta naquela ocasião.

- Como achas o baile? perguntou um dos rapazes a Teófilo.

- Esplêndido!

- Bem, disse Augusto. Vamos agora à eleição. Nós somos os grandes eleitores da rainha do baile. Faço de presidente com um voto na matéria. Digam lá vocês quem lhes parece que seja a rainha.

- Mas falta uma que só vem às onze horas, disse um.

- Quem?

- A Sílvia.

- Venha ou não, disse outro, eu já achei a rainha.

- Quem é?

- É a Leocádia Martins.

- Não digas isso, exclamaram alguns rapazes.

- Por que?

- Porque é uma tolice!

- Tolice!

- Até o nome, disse Augusto. Ora vejam lá: a rainha Leocádia.

- São gostos.

Augusto voltou-se para Teófilo e perguntou-lhe:

- Mas independente de não estar completo este Olimpo, quem é Juno na tua opinião?

- Não sei: acho-as todas igualmente belas.

- Não reparaste bem. Há algumas superiores.

- Será por não reparar bem; mas até aqui pareceu-me que eram todas igualmente belas.

- Esperemos pela Sílvia. Que horas são?

- Falta um quarto para as onze.

- Esperemos.