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Não ficou estéril a aliança de Sanches e Angélica. Cinco foram os frutos de tão abençoada união ... |
Não ficou estéril a aliança de Sanches e Angélica. Cinco foram os frutos de tão abençoada união, dois do sexo masculino e três do sexo feminino. Carlos e Benjamim se chamaram os rapazes; as raparigas receberam os nomes de Teresa, Ermelinda e Joana. Os sinais particulares desta prole eram os seguintes: Joana tinha o nariz muito comprido, Ermelinda era muita pequena, Teresa era alta e cheia. Quanto aos rapazes, a única diferença entre Carlos e Benjamim era que o primeiro ria à cara do segundo regularmente uma vez por semana, sem que o outro tirasse nunca desforra de semelhante afronta. Ultimamente a afronta tinha sido tal que Benjamim achou prudente deixar de falar ao irmão. Havia já cinco dias que reinava entre ambos essa interrupção de relações diplomáticas, quando a festa do entrudo veio reconciliar tudo. No momento em que tomamos conhecimento com a família Sanches estão eles em boa harmonia despejando cera dentro das fôrmas de limões ou enchendo os que já estão prontos com água de cheiro. Fora injustificável esquecimento deixar de mencionar entre os fabricantes de limões o jovem Batista, rapaz alegre e magro, dono de um armarinho na mesma rua em que moravam os Sanches, amigo de moças e até, dizem, namorado de Teresa. Citarei do mesmo modo uma prima de D. Angélica (42 anos) e uma sobrinha da dita (26), sendo que esta (D. Lucinda) era filha daquela (D. Maria). Vinham para a mesa as caçarolas cheias de cera derretida, e todos aqueles operários mergulhavam nelas os limões e as laranjas, ou despejavam cera dentro de fôrmas de pau. - Olhe, prima; este saiu bem bom, diz Lucinda. - Já viu os meus? pergunta Teresa. - Quantos tem você? - Doze. - Eu tenho nove. - Eu cá já fiz vinte e quatro, exclama Carlos. O Benjamim só fez cinco. - Mas é que eu não sei o que tem a minha fôrma, redargúi o pobre Benjamim envergonhado - És um desastrado! não passas disto! - Carlos! que é isso? Eu não quero bulha. Estas palavras foram ditas por D. Angélica que nesse momento, tendo vindo de dentro com a prima D. Maria, contava-lhe não sei que história de legumes e escravos. - Tia Maria hoje não tem feito nada, exclamam as raparigas Sanches. - Pois já não fiz dois limões? - Dois só! está bem aviada! - Está bom, raparigas, dêem cá uma fôrma, não quero parecer que sou vadia. D. Maria sentou-se e fez vagarosamente alguns limões. Houve algum tempo de silêncio, só interrompido pelo andar das escravas, a campainha da cancela da escada, o som do nariz do Batista que estava endefluxado, e nada mais. D. Angélica, que andava de um lado para outro, aproximou-se da mesa e disse: - Bem, acabem com isso por enquanto, que é preciso pôr a mesa. - Já, mamãe! exclamaram as filhas. - Pois então? são duas horas e meia. Carlos aprovou in-petto a idéia de pôr a mesa, e D. Maria, que costumava jantar à uma hora, achou a resolução de D. Angélica acertadíssima. - Tem razão, prima, se deixarmos estas meninas aqui, são capazes de ficar até amanhã. - Não é conveniente, disse Batista com uma voz entrecortada pelas urgências do defluxo, não é conveniente interromper o trabalho enquanto há cera liquida. A cera é um produto que... - Que não dá de jantar! interrompeu brutalmente Carlos pondo a fôrma de lado e levantando-se da mesa. As moças insistiram e ficaram ainda um quarto de hora fazendo limões. Benjamim queria levantar-se também, mas um olhar de Lucinda o deteve e desde já qualquer leitor, ainda que não seja mais perspicaz que um chapéu, terá compreendido que os dois jovens se amavam. |
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