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Pequena, miúda, magra, o pescoço fino, tremia como se viesse da neve... |
Uma vez, Pedro estava só com a Flora, quando bateram à porta: - É o Francisco. - Não, ele bate de outro modo. Decerto alguém que vai passar para o quarto da Rosinha. Deu a volta à chave, abriu. Diante deles estava, com a sua saia suja, o casaco em tiras, o cabelo de estopa por pentear, uma pobre menina. Era horrível. Pequena, miúda, magra, o pescoço fino, tremia como se viesse da neve. E parecia que lhe tinham dado por dentro da pele um violento banho de enxofre. Tinha jalde a face, a pele das mãos era amarela, os lábios, sem sangue, laivavam-se de amarelo, e nas olheiras cor-de-perpétua a esclerótica era cor-de-ovo. Lembrava um espectro de pesadelo, um ser irreal, onde só os seios duros e eretos davam uma impressão de vida impetuosa. Quando viu Pedro, agarrou-se à porta, a face contraída, tremendo. - Que queres? indagou colérica Flora. - Foi a senhora sua mãe que mandou. Pensava estar só, balbuciou a petiz. - Não disse já que não aparecesse aqui? - Foi sem vontade. Desculpe. Eu não gosto, não, de aparecer. E foi recuando, pávida. Berta fechou a porta. - Que bicho é esse? - Uma rapariguita, que está aí de favor. Ajuda lá na cozinha. - Não a tinha visto ainda. - Tem medo, é uma tola. Imagina tu que tem medo aos homens! Por isso não aparece. - Mau lugar escolheu ela. Mas de novo arranhavam à porta. E de fora uma voz lívida, voz de medo, de angústia, de pavor, de choro, quase soluçante, dizia: - Sou eu ainda, minha senhora. Sua mãe manda buscar a bacia... |
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