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Já ninguém se falava direito, já ninguém conversava. Havia entre nós um ladrão... |
O hotel convulsionava-se. Só o senador Gomes resmungou: - Que besta! E aquela frase dita tristemente preocupou-me. No fundo, porém, o sujo e ilustre homem tinha razão. O gatuno, ou o sportman da ladroeira não era Antônio, era outro, existia, anunciava a sua presença, estava ali, ao nosso lado. Audácia? Loucura? Estupidez? No dia seguinte deu-se por falta do colar de ouro com pedras finas da atriz Simões, os brincos da mulher do tuberculoso sumiram-se. Foi o terror. Os hóspedes trancavam o quarto e saíam levando os valores no bolso, mesmo para almoçar. A limpeza era feita na presença dos respectivos locatários. Já ninguém se falava direito, já ninguém conversava. Havia entre nós um ladrão. Um ladrão! O medo prendia as senhoras aos quartos. Ninguém saía sem necessidade urgente, com receio de ser apontado pelo menos um segundo, como o fora o Antônio. Éramos os forçados daqueles crimes; tínhamos que chegar à tragédia. O gerente, lívido, armava uma polícia interna ferocíssima; os criados serviam, coitados! com uma humildade dolorosa, temendo a suspeita, o ex-vice-presidente da ex-missão do México teimava em escrever ao chefe de polícia, em varejar os quartos. - Pelo amor de Deus! gemia o proprietário. - É outra tolice, acrescentava Gomes. Nós temos aqui gente respeitável. - Pois está claro! dizia logo Mme de Santarém, divorciada pela quarta vez. E, apesar da vigilância, continuaram a desaparecer objetos. Não era possível! Ou sair, ou dar queixa à polícia. Uma vez encontrei na cidade Melchior e Pontes, acompanhando Mme de Santarém a uma confeitaria. Eram duas horas da tarde. Voltei à pensão. Por uma coincidência, morava no mesmo corredor que essas três pessoas, mesmo pegado ao senador Gomes. Estava a despir-me, quando senti passos abafados. Abri a porta devagar. Era o alegre e sempre espirituoso Pontes. Vinha para o seu quarto. Mas não. Parou no quarto de Mme. de Santarém, experimentou uma chave, torceu, entrou. Oh! a imoralidade dos hotéis honestos! O felizardo ia gozar as delícias de um aprês-midi amoroso com a honestíssima senhora! Pouco depois, porém, ouvi um leve rumor, espiei de novo. Era Pontes, com o ar mais natural, que fechava o quarto e andava ligeiro. Quis fazer-lhe uma pilhéria, gritar; - aí maganão! ou outra parvoice qualquer - porque eu sou de natural påndego. Mas deixei para o jantar, recolhi. E no jantar Mme de Santarém, que chegara momentos antes, apareceu transmudada: tinham-lhe roubado o broche de rubis. |
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