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Poucas vezes ia ao antigo Pedro II, e as poucas em que lá fui,
era das galerias que assistia ao espetáculo.
Munido do competente bilhete, às oito horas, entrava, subia,
procurava o lugar marcado e, nele, mantinha-me, durante a
representação. De forma que aquela sociedade brilhante que eu via
formigar nos camarotes e nas cadeiras, me aparecia distante, colocada
muito afastada de mim, em lugar inacessível, no fundo de cratera de
vulcão extinto. Cá do alto, debruçado na grade, eu sorvia o vazio
da sala com a volúpia de uma atração de abismo. As casacas
corretas, os uniformes aparatosos, as altas toilettes das senhoras,
semeadas entre eles, tentavam-me, hipnotizavam-me. Decorava os
movimentos, os gestos dos cavalheiros e procurava descobrir a harmonia
oculta entre eles e os risos e os ademanes das damas.
Nos intervalos, encostado a uma das colunas que sustentam o teto,
observando os camarotes, apurava o meu estudo do hors-ligne, do
distinto, com os espectadores que ficavam nas lojas.
Via correrem-se-lhes os reposteiros, e os cavalheiros bem
encasacados, juntarem os pés, curvarem ligeiramente o corpo,
apertarem ou mesmo beijarem a mão das damas que se mantinham eretas,
encostadas a uma das cadeiras, de costas para a sala, com o leque em
uma das mãos caídas ao longo do corpo. Quantas vezes não tive
ímpetos de ali mesmo, com risco de parecer doido ao polícia vizinho,
imitar aquele cavalheiro?
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