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Vistos estes autos de pedido originário de habeas corpus, impetrado por José Eduardo de Macedo Soares, em seu favor e de mais três outros pacientes, constantes da respectiva petição; - do referido pedido se verifica o seguinte:
Que os pacientes foram detidos em virtude de ordem expedida pelo governo federal durante o presente estado de sítio, declarado pelo decreto do poder executivo de 4, e prorrogado pelo de 31 de março deste ano, abrangendo o território do Distrito Federal e das comarcas de Niterói e Petrópolis, no vizinho Estado do Rio de Janeiro.
Que, embora cientes de que a sua detenção é medida ordenada em conseqüência do dito estado de sítio, se julgam com o direito ao presente pedido: 1º, porque semelhante estado de sítio, não foi decretado de acordo com os fatos e condições rigorosas do art. 80, da Constituição, sendo por isso um ato inconstitucional; 2º, porque, embora se possa objetar que se trata de questão política, é o Supremo Tribunal Federal competente para conhecer da espécie, como autoridade suprema, e como já assim tem entendido e decido em casos análogos.
Em resumo, são estes os fundamentos do pedido, que devem ser examinados e considerados; e pelo que:
Considerando que se é verdade, como é, que ao Supremo Tribunal Federal, cabe o exame dos atos dos dois outros poderes, quando argüidos de lesivos de direitos individuais pelos vícios de ilegalidade ou inconstitucionalidade, nem por isto poderá o tribunal, estender o uso dessa atribuição até ao ponto de julgar do mérito de atos que envolvem a própria independência de cada um dos três poderes, todos existindo e devendo funcionar dentro dos limites postos pela Constituição;
Considerando, que, é justamente por força desta limitação, inerente ao exercício dos aludidos poderes, que o judiciário, em regra, só julga dos efeitos ou fatos decorrentes de atos dos dois outros poderes, porventura lesivos dos direitos individuais, e jamais dos motivos ou razões, pelas quais foram tais atos adotados ou postos em execução;
Considerando ainda sobre este ponto, que é princípio cardeal do direito constitucional, relativamente ao exercício dos poderes públicos, armados de igual independência quanto às suas funções privativas, que, uma vez expressamente conferida a um deles uma atribuição para a prática de dado ato ou para o uso de dada faculdade, é ele o único juiz competente da oportunidade e das razões determinantes do respectivo ato, ou do uso da sua faculdade; porque o contrário seria a negação completa da sua independência;
Considerando, que no caso sujeito, o presidente da República, tendo declarado o estado sítio em vista das razões constantes dos documentos aludidos, e tendo durante o estado de sítio, mandado deter os pacientes, usara de faculdade que lhe é conferida por um texto expresso da Constituição (art. 80, parágrafos 1º e 2º);
Considerando, que, se porventura essas razões não devessem bastar para assim proceder, a própria Constituição declara juntamente qual seja o juiz privativo para conhecer e julgar do se ato, já aprovando ou suspendendo o estado de sítio (Const., art. 34, n. 21), já sujeitando o mesmo presidente da República a acusação se para tanto houvesse fundamento, (lei n. 27, de 7 de janeiro de 1892, art. 33);
Considerando, conseguintemente, que, em vista da própria Constituição ora invocada pelos pacientes em apoio da intervenção do Supremo Tribunal Federal, o que resulta não é o direito dessa intervenção, mas a exclusão manifesta do judiciário para julgar do caso sujeito; porquanto, se o tribunal interviesse, a conseqüência desse seu ato seria:
a) arrogar-se ele uma atribuição que é privativamente conferida a outro poder, o Congresso Nacional;
b) desconhecer a independência do poder executivo para decretar o estado de sítio, inquirindo e julgando dos motivos que teve esse poder para assim fazê-lo;
c) anular virtualmente o próprio estado de sítio, fazendo cessar, pelo habeas corpus, a medida resultante dele, isto é, a detenção dos indivíduos, mesmo quando feita de acordo com a Constituição;
Considerando, por outro lado, que, competente como é este tribunal para julgar das medidas executadas ex-vi de estado de sítio, e assim tem feito e decidido em diversos casos, os pacientes nada alegam a esse respeito, a dizer, no sentido de demonstrar que o presidente da República haja exorbitado das suas faculdades, quanto à forma e extensão de tais medidas;
Considerando, finalmente que, admitida como correta, que é, a autoridade do Supremo Tribunal Federal para conhecer de quaisquer atos dos poderes políticos, quando ofensivos dos direitos individuais, por ser ele o intérprete final da Constituição e das leis, nem por isto a conseqüência, única obrigada, seria a de julgar do mérito do pedido em questão, mas também a de poder declarar, ele próprio, se a controvérsia constitui, ou não, um caso judicial, ou uma questão meramente política; como assim o tem tantas vezes feito a Suprema Corte dos Estados Unidos da América;
Por tudo isto, Acordam em tomar conhecimento do pedido para poder bem verificar qual seja a natureza dos fatos e fundamentos alegados, mas, à vista do que, em declarar-se incompetente para julgar do mérito do mesmo pedido, desde que o seu fundamento, único invocado, a inconstitucionalidade da decretação do estado de sítio, é matéria estranha ao Poder Judiciário. Custas na forma da lei.
Supremo Tribunal Federal; 15 de abril de 1914. - H. do Espírito Santo, presidente. - Amaro Cavalcanti, relator. - Godofredo Cunha.
Não tomei conhecimento do pedido, porque o Tribunal é incompetente para conhecer originariamente de habeas corpus quando o constrangimento ou ameaça de constrangimento consistir em detenção, durante o estado de sítio, em lugar não destinado aos réus de crimes comuns, ou em desterro para outros portos do território nacional, se tais medidas forem, como na espécie, autorizadas pelo presidente da República; é o que dispõe textualmente o nosso Regimento (art. 16, parágrafo 2º letra b).
De meritis, neguei a ordem de acordo com a doutrina do acórdão, que não é diferente da que sempre sustentei com relação às questões puramente políticas. - M. Murtinho. - Leoni Ramos. - Pedro Lessa, vencido.
Ao Supremo Tribunal Federal compete, por expressa e indiscutível disposição dos arts. 59, parágrafo 1º, e 60 da Constituição Federal, declarar inconstitucionais as leis, promulgadas pelo poder legislativo da União, ou dos Estados, e inconstitucionais ou ilegais os atos do poder executivo, da União, ou dos Estados (além dos preceitos constitucionais citados, art. 13, da lei n. 221, de 20 de novembro de 1894, e art. 6º da lei n. 1.939, de 28 de agosto de 1908).
Essa atribuição do Supremo Tribunal Federal abrange todas as leis elaboradas pelo poder legislativo e todos os atos e decisões do poder executivo. Na Constituição nenhuma exceção, nenhuma restrição se nos depara a esse princípio de direito público federal.
Nunca se entendeu que esse princípio seja contrário à independência dos outros dois poderes. Estes podem fazer tudo, menos o legislativo leis inconstitucionais, e o executivo decretar medidas inconstitucionais, ou ilegais.
Este é que é o nosso sistema tal como foi engendrado na América do Norte, e transplantado para o Brasil e outros países.
Quando se trata de um decreto do executivo, como é a presente hipótese, há algum motivo de ordem constitucional que obste a que o Supremo Tribunal Federal exerça essa função máxima?
O fato de nesse decreto se declarar em estado de sítio uma parte do território nacional ou todo este, impede que o Tribunal exercite a sua faculdade constitucional, que é também um obrigação, imposta pela lei fundamental, de julgar inconstitucional o ato do executivo, e garantir os direitos individuais ofendidos por esse ato? Absolutamente não. Na Constituição nenhuma norma se lê, que restrinja a competência do Tribunal nesta espécie.
Da atribuição do Congresso de aprovar ou suspender o sítio declarado pelo executivo (art. 34, n. 21, da Constituição), não se pode inferir ou deduzir, que nesta hipótese seja vedado ao Tribunal declarar inconstitucional o ato do executivo.
Mesmo depois de aprovado o sítio pelo Congresso nada pode embaraçar uma decisão em que o Tribunal garanta direitos individuais, lesados pelo ato do executivo, aprovados pelo legislativo.
Como, pois, se há de abster o Tribunal de amparar direitos individuais, feridos pelo decreto do sítio, porque este ainda não foi examinado pelo Congresso?
Se querem nos precedentes um aresto, temo-lo, e da Suprema Corte Norte-Americana. Eis como o define Willonghby, no segundo volume da sua notável obra, The Constitutional Law of the United States, pag. 1.245:
"Fire of the justices of the Supreme Court held that Congress was without the constitucional autority to suspend or authorise the suspension of the writ of habeas corpus, and provide military comnissions in States outside the sphere of active military operations and with their, civil courts open and ready for the transaction of judical business. The justices held that Congress had not in fact made legislative, provision for the military tribunal in question, but asserted that it possessed the constitucional autority so to do, sheuld it see fit".
Durante a guerra civil, conhecida pela denominação de guerra de secessão, luta tremenda que durou cinco anos, criaram-se tribunais militares e suspendeu-se o habeas corpus de acordo com uma lei do Congresso, que autorizara o presidente da República a decretar as duas medidas excepcionais (obra e páginas citadas).
O presidente da União aplicou essas medidas extremas, não só aos Estados conflagrados, como aos Estados pacíficos, vizinhos dos convulsionados. No Estado de Indiana, onde havia tranqüilidade, mas que era vizinho dos em que acesa a guerra, foi preso Milligan que requereu um habeas corpus.
Julgou a maioria da Suprema Corte Federal (five of the justices), que ao Congresso faltava competência para autorizar a suspensão do habeas corpus nos Estados em que nenhuma luta se dava, sendo-lhe permitido pela Constituição somente tomar essa providência excepcional para os Estados assolados pela guerra civil.
A minoria (the remaining four justices), pareceu que ao Congresso era lícito autorizar a suspensão de habeas corpus e a criação de comissões militares judiciárias, não só nos Estados em guerra, como também nos outros, especialmente nos vizinhos, donde bem podiam contribuir para alimentar a luta, fornecendo combatentes e dinheiro, mas que na realidade não o tinha feito.
Sem embargo dessa divergência, foi concedida unanimemente a ordem impetrada, prevalecendo como motivo de decidir a opinião dos que julgavam falecer ao Congresso diante da Constituição poder para autorizar a suspensão do habeas corpus nos Estados em paz, posto que vizinhos dos conflagrados. Ficou vitorioso o conceito (note-se bem), de que somente nos Estados em que se verifica a rebelião, ou a invasão estrangeira, é permitido ao Congresso suspender o habeas corpus. Ficou mais vencedor o princípio de que a Suprema Corte Federal tem competência para, com intérprete final da Constituição, declarar inconstitucional uma lei que suspende o habeas corpus e autoriza a criação de tribunais militares em momentos de guerra civil, e para o fazer em um processo de habeas corpus, e para o fim de garantir direitos individuais.
Excluída a má fé, que mais se pode exigir em matéria de precedentes, de arestos, de jurisprudência, para autorizar o voto por menos proferido?
Dir-se-á talvez que, para se poder invocar uma jurisprudência, é mister que haja uma série de julgados. Em relação à espécie destes autos é impossível descobrir essa pluralidade e uniformidade de julgados; porque nos Estados Unidos durante mais de um século só uma vez o Congresso autorizou o presidente da República a suspender o habeas corpus (Thayer, Cases ou Constitucional Law, vol. 2º, página 2.377 e seguintes).
Eu não hei de descer a procurar arestos nas repúblicas da América Latina, onde se imitam as instituições norte-americanas.
Basta lembrar que na mais adiantada delas, a Argentina, em menos de meio século mais de trinta vezes foi decretado o estado de sítio (Agustin de Vedias, Constitution Argentina, - página III, ed. de 1907), cumprindo não esquecer que, uma vez o sítio foi ali decretado, só porque se deu um incêndio numa província, e o Congresso aprovou o ato (Barraquero, Espiritu y Pratica de la Constitución Argentina, pag. 369, in fine, de 1889)!...
Está claro que as únicas decisões que nos devem guiar na exegese do direito público federal, são as do povo que criou esse direito, que o aplica, interpretando-lhe fielmente os preceitos, e que tem dado provas de que sabe respeitar a justiça e as liberdades dos indivíduos.
Objetar que há diferenças entre a hipótese destes autos e o caso Milligan, porque dos Estado Unidos, o Congresso autorizou o presidente da União a suspender o habeas corpus e a criar comissões militares judicantes, ao passo que entre nós só se deu a decretação do estado de sítio, é o mesmo que, depois de bem provado que um indivíduo é maior e de bem demonstrado que a lei lhe permite dispor de todos os seus bens como lhe aprouver, doando-os a quem muito bem quiser, não consentir em que esse mesmo indivíduo transija sobre parte de seus bens, porque não ficou demonstrado que ele pudesse transigir sobre parte de seus bens, estando apenas provado que lhe era facultado fazer doação de todos os seus bens.
O que decidiu a Suprema Corte Federal norte-americana, foi muito mais de que o proposto no meu voto vencido.
Em meio de um horrenda guerra civil, que durou cinco anos, havendo uma lei que autorizava o presidente da República a suspender o habeas corpus e a criar tribunais militares no território da União, a Suprema Corte Federal, baseada na Constituição revogar parcialmente, cassou, anulou em parte o ato do executivo expedido por autorização do legislativo.
Limitou os decretos dos dois poderes, só permitindo que produzissem efeito nos Estados em guerra.
A Suprema Corte Federal mutilou esses atos essencialmente políticos dos outros dois poderes, fazendo respeitar a liberdade individual, ofendida por esses atos.
E assim procedeu em observância da Constituição, cujo intérprete final é incontestadamente. Importa muito notar que absolutamente não consta que durante toda a guerra civil a Suprema Corte Federal só uma vez tenha proferido decisão em que se encerrasse doutrina contraria à por ela adotada no caso Milligan, decisão em que se desamparasse a liberdade individual, ferida por atos inconstitucionais do poder executivo, pela convicção de que é preciso em tão graves momentos cercar de prestígio esse poder.
Nem se objete que entre nós o estado de sítio, decretado pelo presidente da República, é aprovado, ou suspenso pelo Congresso, ao passo que nos Estados Unidos a Constituição não criou este juiz privativo - o Congresso - para apreciar o sítio decretado pelo executivo e aprová-lo ou não, com exclusão de qualquer outro poder.
Fora um sofisma pueril, que em nada aproveitaria aos turibulários dos abusos do poder executivo.
Nos Estado Unidos não há juiz privativo para aprovar ou suspender a suspensão de habeas corpus, decretada, pelo executivo, pela simples razão de que lá a suspensão de habeas corpus só pode ser determinada pelo executivo, depois de autorizado este pelo Congresso (Constituição Americana, artigo 1º, seção 9, alínea 2ª, interpretada pela mesma divisão no caso Milligan, Willonghby, obra e lugar citados. Thayer, obra e lugar citados).
Foi essa suspensão de habeas corpus, autorizada pelo Congresso, e decretada pelo executivo, que a Suprema Corte Federal anulou em seus efeitos relativos à liberdade individual, quando aplicada aos Estados pacíficos, posto que vizinhos dos conflagrados.
Se a Suprema Corte, em momento da mais grave comoção intestina que se pode imaginar, diante do estado de sítio, decretado pelos dois poderes, nulificou a medida nos Estados não conflagrados, por lhe parecer que só onde havia luta permitia a Constituição o uso desse remédio extremo.
E nós, em meio da mais completa tranqüilidade, quando nenhum sinal se observa da mais leve comoção intestina (e não se conhece grave comoção social oculta ou recolhida);
quando afirmar que nesta capital, ou na pacífica Niterói e na pacatíssima Petrópolis, se verifica uma grave comoção intestina, é tão grotesco e absurdo, como pretender incutir no espírito de alguém a idéia de que está ameaçado de morte por uma grave enfermidade um indivíduo que, são o lépido alimentado perfeitamente bem, vemos a cada passo entregue as suas ocupações e divertimentos habituais;
nós havemos de em tais condições negar a proteção legal à liberdade individual, pelo fato de termos diante dos olhos um decreto de sítio do poder executivo; muito mais claramente inconstitucional do que o assim declarado pela Suprema Corte Federal norte-americana?
Já se observou que o julgado da Suprema Corte dos Estados Unidos no caso Milligan, em vez de ser adotado como um modelo, deve ser antes repelido pelas perigosas conseqüências que pode produzir.
Só o executivo pela sua especial posição, está em condições de bem conhecer os segredos de um dado momento político, só ele pode estar de tal modo informado de certos fatos de natureza criminosa, ou de ordem internacional, que sempre lhe seja dado decretar o sítio oportuna e eficazmente, no instante precisamente conveniente.
Muitas vezes o poder judiciário não possui, nem deve possuir, os indispensáveis esclarecimentos para saber qual o momento exatamente apropriado para a aplicação de tão heróico remédio.
Tolerar que o poder judiciário garanta a liberdade individual num estado de sítio inconstitucionalmente decretado (e a isto se reduz toda a ação do poder judiciário no caso figurado), é tolher a atividade própria de governo, ou como já se disse, instituir a ditadura judiciária.
Essa observação releva simultaneamente duas grandes verdades: o abismo que nos separa da grande república norte-americana em matéria de idéias e de costumes políticos, e na aplicação das instituições por nós apenas macaqueadas, e a grande miséria moral deste ambiente, incompatível com tão aperfeiçoado e nobre aparelho constitucional. Nos Estado Unidos uma só vez foi autorizado o sítio pelo Congresso num longo período de muito mais de um século.
Lá, apesar de ser tremenda a conjuntura, não consta que o executivo tenha sido fértil em abuso.
Há o caso Milligan, o caso Merryman, o caso Kemp, e talvez alguns outros, mas, nunca tantos e tão graves, como em situações muito menos sérias se têm produzido nas repúblicas da América Latina.
Pois, sem embargo, de tudo isso, os constitucionalistas e jurisconsultos norte-americanos, ao noticiarem em seus livros o celebre caso Milligan, nunca se lembraram de censurar a decisão da Suprema Corte, ou de fazer reflexões sobre os inconvenientes e perigos de uma jurisprudência baseada na memorável sentença.
Aqui, onde o grande perigo, já várias vezes verificado, reside exatamente nos abusos do poder executivo, e a grande necessidade, sentida por todos os espíritos liberais, é que não nos limite mais a uma burlesca imitação das instituições norte-americanas, mas, pelo contrário, façamos todos os esforços por penetrar o espírito daquela soberba criação política, neste ponto invejada pela própria Europa, e respeitemos a Suprema Corte Federal, com as atribuições que a Constituição e a prática do sistema lhe conferiram; aqui chegam a vislumbrar sinais de ditadura judicial (ditadura sem tesouro e sem força material), na opinião dos que almejam que se faça muito menos do que fez o augusto tribunal norte-americano!
No país onde mais necessário se faz o exercício do poder moderador da Corte Suprema é que esta mais deve ceder e abdicar suas atribuições em favor dos abusos do poder executivo!
... Onde mais indispensável é o remédio, mais se deve respeitar a propinação do veneno! Em tudo isso só há um perigo imaginário, e é o do poder judiciário embaraçar o executivo, nos momentos em que este precise seriamente suspender as garantias constitucionais, por estarmos ameaçados de uma guerra internacional, ou de um grave comoção intestina. Este perigo nunca se realizou.
Não consta absolutamente que nos países sujeitos ao direito público federal se tenha alguma vez prejudicada a defesa da sociedade, das instituições, ou da ordem pública, pelo fato de haver a Suprema Corte amparado com seus arestos a liberdade individual.
O que sabemos perfeitamente por experiência própria e pelo que das repúblicas da América Latina referem os seus escritos, é que os abusos perpetrados pelo executivo à sombra do sítio são grandes e muitos.
Por falta de argumentos jurídicos contra a doutrina concretizada no caso Milligan, já se disse que, se vingasse tal jurisprudência, freqüentes seriam os conflitos entre o judiciário e o executivo.
Tal raciocínio assenta exclusivamente no fato de se não conhecer o direito público federal. Não pode haver conflito entre o executivo e a Suprema Corte Federal, em face da Constituição, porque a Suprema Corte é a intérprete final da mesma Constituição, e aos outros dois poderes cumpre acatar as sentenças dessa Corte, sempre que ela declara inconstitucional uma lei, ou um ato do executivo. Essa superioridade da Suprema Corte decorre fatalmente da sua missão de intérprete final da Constituição:
"If an act is held void, it is because it is contrary to the constitution, and not because the court any central over the legislative. The wil of the people as expressad in its fundamental law, is considered as mose direct and authoritative, than their representatives in congressional enoctencent." (Willaughby, The Supreme Court of the United States, página
37). Uma lei ou decisão do executivo é inválida porquanto fere a Constituição, interpretada pela Suprema Corte Federal e não porque esta exerça um superintendência sobre os outros dois poderes.
Mas, devendo prevalecer sempre os arestos da Suprema Corte na interpretação e aplicação dos preceitos constitucionais e das leis ordinárias, e podendo esse tribunal tornar ineficazes os atos dos outros dois poderes, o que temos em última análise é a superioridade da Corte Suprema no funcionamento das instituições.
Digam embora que a preponderância é da Constituição, ou da vontade do povo manifestada diretamente pela lei fundamental; o que é certo, é que no direito público federal à Suprema Corte compete dizer a última palavra sobre os atos dos outros dois poderes.
Sendo manifesta e indiscutivelmente inconstitucional o estado de sítio decretado pelo presidente da República, o qual para os fatos a que alude em seus decretos, dispõe dos meios comuns de repressão (J. Barbalho, Commentario, página 119, in fine e 120), votei, concedendo a ordem impetrada. É este o momento oportuno para amparar a liberdade individual dos pacientes, ofendida pelo ato inconstitucional. - Canuto Saraiva. - J. L. Coelho e Campos. - G. Natal. -
Neguei a ordem impetrada, por se fundar o pedido na alegação de que o estado de sítio fora decretado sem que houvessem ocorrido as condições em que é facultado ao executivo essa medida excepcional, e não poder o judiciário apurar regularmente em um processo de habeas corpus a verdade da alegação, uma vez que a Constituição só obriga o executivo a dar conta da oportunidade, da decretação do sítio ao Congresso Nacional, logo que se reúna (parágrafo 3º do artigo 81). - Oliveira Ribeiro. - André Cavalcanti.
OPÇÕES DE NAVEGAÇÃO NO MESMO TEMA:
(Fonte: links do site www.casaruibarbosa.gov.br)